terça-feira, 29 de dezembro de 2009

A Pequena Alma e o Sol

Era uma vez, em tempo nenhum, uma Pequena Alma que disse a Deus:
- Eu sei quem sou!

E Deus disse:

- Que bom! Quem és tu?

E a Pequena Alma gritou:                        


- Eu sou Luz

E Deus sorriu.

- É isso mesmo! - exclamou Deus. - Tu és Luz!

A Pequena Alma ficou muito contente, porque tinha descoberto aquilo que todas as almas do Reino deveriam descobrir.

- Uauu, isto é mesmo bom! - disse a Pequena Alma.



Mas, passado pouco tempo, saber quem era já não lhe chegava.

A pequena Alma sentia-se agitada por dentro, e agora queria ser quem era.

Então foi ter com Deus (o que não é má ideia para qualquer alma que queira ser Quem Realmente É) e disse:

- Olá Deus! Agora que sei Quem Sou, posso sê-lo?

E Deus disse:

- Quer dizer que queres ser Quem já És?

- Bem, uma coisa é saber Quem Sou, e outra coisa é sê-lo mesmo.

Quero sentir como é ser a Luz! - respondeu a pequena Alma.

- Mas tu já és Luz - repetiu Deus, sorrindo outra vez.

- Sim, mas quero senti-lo! - gritou a Pequena Alma.

- Bem, acho que já era de esperar. Tu sempre foste aventureira - disse Deus com uma risada.

Depois a sua expressão mudou.

- Há só uma coisa...

O quê? - perguntou a Pequena Alma.

- Bem, não há nada além da Luz.

Porque eu não criei nada além daquilo que tu és; por isso, não vai ser fácil experimentares-te como Quem És, porque não há nada que tu não sejas.

- Hã? - disse a Pequena Alma, que já estava um pouco confusa.

- Pensa assim: tu és como uma vela ao Sol. Estás lá sem dúvida.

         


Tu e mais milhões, ziliões de outras velas que constituem o Sol.

E o Sol não seria o Sol sem vocês. "Não seria um sol sem uma das suas velas... e isso não seria

de todo o Sol, pois não brilharia tanto. E no entanto, como podes conhecer-te como a Luz

quando estás no meio da Luz - eis a questão".

- Bem, tu és Deus. Pensa em alguma coisa! - disse a Pequena Alma mais animada.

Deus sorriu novamente.

- Já pensei. Já que não podes ver-te como a Luz quando estás na Luz, vamos rodear-te de escuridão - disse Deus.

- O que é a escuridão? perguntou a Pequena Alma.

- É aquilo que tu não és - replicou Deus.

- Eu vou ter medo do escuro? - choramingou a Pequena Alma.

- Só se o escolheres. Na verdade não há nada de que devas ter medo, a não ser que assim o decidas. Porque estamos a inventar tudo. Estamos a fingir.

- Ah! - disse a Pequena Alma, sentindo-se logo melhor.

Depois Deus explicou que, para se experimentar o que quer que seja, tem de aparecer exactamente o oposto.

- É uma grande dádiva, porque sem ela não poderíamos saber como nada é - disse Deus - Não poderíamos conhecer o Quente sem o Frio, o Alto sem o Baixo, o Rápido sem o Lento. Não poderíamos conhecer a

Esquerda sem a Direita, o Aqui sem o Ali, o Agora sem o Depois.   



E por isso, - continuou Deus - quando estiveres rodeada de escuridão, não levantes o punho nem a voz

para amaldiçoar a escuridão.

"Sê antes uma Luz na escuridão, e não fiques furiosa com ela. Então saberás Quem Realmente És, e os outros também o saberão.Deixa que a tua Luz brilhe tanto que todos saibam como és especial!"

- Então posso deixar que os outros vejam que sou especial? - perguntou a Pequena Alma.

- Claro! - Deus riu-se. - Claro que podes! Mas lembra-te de que "especial" não quer dizer "melhor"! Todos são especiais, cada qual à sua maneira! Só que muitos esqueceram-se disso. Esses apenas vão ver

que podem ser especiais quando tu vires que podes ser especial!

- Uau - disse a Pequena Alma, dançando e saltando e rindo e pulando. - Posso ser tão especial quanto quiser!     


- Sim, e podes começar agora mesmo - disse Deus, também dançando e saltando e rindo e pulando juntamente com a Pequena Alma - Que parte de especial é que queres ser?

- Que parte de especial? - repetiu a Pequena Alma. - Não estou a perceber.

- Bem, - explicou Deus - ser a Luz é ser especial, e ser especial tem muitas partes. É especial ser bondoso. É especial ser delicado. É especial ser criativo. É especial ser paciente. Conheces alguma outra maneira de

ser especial?

A Pequena Alma ficou em silêncio por um momento.

- Conheço imensas maneiras de ser especial! - exclamou a Pequena Alma - É especial ser prestável. É especial ser generoso. É especial ser simpático. É especial ser atencioso com os outros.

- Sim! - concordou Deus - E tu podes ser todas essas coisas, ou qualquer parte de

especial que queiras ser, em qualquer momento. É isso que significa ser a Luz.

- Eu sei o que quero ser, eu sei o que quero ser! - proclamou a Pequena Alma com grande entusiasmo.

- Quero ser a parte de especial chamada "perdão". Não é ser especial alguém que perdoa?

- Ah, sim, isso é muito especial, assegurou Deus à Pequena Alma.

- Está bem. É isso que eu quero ser.

Quero ser alguém que perdoa. Quero experimentar-me assim - disse a Pequena Alma.

- Bom, mas há uma coisa que devias saber - disse Deus.

A Pequena Alma já começava a ficar um bocadinho impaciente. Parecia haver sempre alguma complicação.

- O que é? - suspirou a Pequena Alma.

- Não há ninguém a quem perdoar.

- Ninguém? A Pequena Alma nem queria acreditar no que tinha ouvido.

- Ninguém! - repetiu Deus. Tudo o que Eu fiz é perfeito. Não há uma única alma em toda a Criação menos perfeita do que tu. Olha à tua volta.

Foi então que a Pequena Alma reparou na multidão que se tinha aproximado. Outras almas tinham vindo de todos os lados - de todo o Reino - porque tinham ouvido dizer que a Pequena Alma estava a ter uma

conversa extraordinária com Deus, e todas queriam ouvir o que eles estavam a dizer.




Olhando para todas as outras almas ali reunidas, a Pequena Alma teve de concordar.

Nenhuma parecia menos maravilhosa, ou menos perfeita do que ela. Eram de tal forma maravilhosas, e a sua Luz brilhava tanto, que a Pequena Alma mal podia olhar para elas.

- Então, perdoar quem? - perguntou Deus.

- Bem, isto não vai ter piada nenhuma! - resmungou a Pequena Alma - Eu queria experimentar-me como Aquela que Perdoa. Queria saber como é ser essa parte de especial.

E a Pequena Alma aprendeu o que é sentir-se triste. Mas, nesse instante, uma Alma Amiga destacou-se da multidão e disse:

- Não te preocupes, Pequena Alma, eu vou ajudar-te - disse a Alma Amiga.

- Vais? - a Pequena Alma animou-se. - Mas o que é que tu podes fazer?

- Ora, posso dar-te alguém a quem perdoares!

- Podes?

- Claro! - disse a Alma Amiga alegremente. - Posso entrar na tua próxima vida física e fazer qualquer coisa para tu perdoares.

- Mas porquê? Porque é que farias isso? - perguntou a Pequena Alma. - Tu, que és um ser tão absolutamente perfeito! Tu, que vibras a uma velocidade tão rápida a ponto de criar uma Luz de tal forma brilhante que mal posso olhar para ti! O que é que te levaria a abrandar a tua vibração para uma velocidade

tal que tornasse a tua Luz brilhante numa luz escura e baça? O que é que te levaria a ti, que danças sobre as estrelas e te moves pelo Reino à velocidade do pensamento, a entrar na minha vida e a tornares-te tão pesada a ponto de fazeres algo de mal?

- É simples - disse a Alma Amiga. - Faço-o porque te amo.

A Pequena Alma pareceu surpreendida com a resposta.

- Não fiques tão espantada - disse a Alma Amiga - tu fizeste o mesmo por mim.

Não te lembras? Ah, nós já dançámos juntas, tu e eu, muitas vezes. Dançámos ao longo das eternidades e através de todas as épocas.Brincámos juntas através de todo o tempo e em muitos sítios. Só que tu não te lembras. Já fomos ambas o Todo. Fomos o Alto e o Baixo, a Esquerda e a Direita. Fomos o Aqui e o Ali,

o Agora e o Depois. Fomos o Masculino e o Feminino, o Bom e o Mau - fomos ambas a vítima e o vilão. Encontrámo-nos muitas vezes, tu e eu; cada uma trazendo à outra a oportunidade exacta e perfeita para Expressar e Experimentar Quem Realmente Somos.




- E assim, - a Alma Amiga explicou mais um bocadinho - eu vou entrar na tua próxima vida física e ser a "má" desta vez. Vou fazer alguma coisa terrível, e então tu podes experimentar-te como Aquela Que

Perdoa.

- Mas o que é que vais fazer que seja assim tão terrível? - perguntou a Pequena Alma, um pouco nervosa.

- Oh, havemos de pensar nalguma coisa - respondeu a Alma Amiga, piscando o olho.

Então a Alma Amiga pareceu ficar séria, disse numa voz mais calma:

- Mas tens razão acerca de uma coisa, sabes?

- Sobre o quê? - perguntou a Pequena Alma.

- Eu vou ter de abrandar a minha vibração e tornar-me muito pesada para fazer esta coisa não muito boa. Vou ter de fingir ser uma coisa muito diferente de mim. E por isso, só te peço um favor em troca.

- Oh, qualquer coisa, o que tu quiseres! - exclamou a Pequena Alma, e começou a dançar e a cantar: - Eu vou poder perdoar, eu vou poder perdoar!

Então a Pequena Alma viu que a Alma Amiga estava muito quieta.



- O que é? - perguntou a Pequena Alma.



- O que é que eu posso fazer por ti? És um anjo por estares disposta a fazer isto por mim!



- Claro que esta Alma Amiga é um anjo!- interrompeu Deus, - são todas! Lembra-te sempre: Não te enviei senão anjos.






E então a Pequena Alma quis mais do que nunca satisfazer o pedido da Alma Amiga.



- O que é que posso fazer por ti? - perguntou novamente a Pequena Alma.



- No momento em que eu te atacar e atingir, - respondeu a Alma Amiga - no

momento em que eu te fizer a pior coisa que possas imaginar, nesse preciso momento...



- Sim? - interrompeu a Pequena Alma



- Sim?



A Alma Amiga ficou ainda mais quieta.



- Lembra-te de Quem Realmente Sou.



- Oh, não me hei-de esquecer! - gritou a Pequena Alma - Prometo! Lembrar-me-ei sempre de ti tal como te vejo aqui e agora.



- Que bom, - disse a Alma Amiga - porque, sabes, eu vou estar a fingir tanto, que



eu própria me vou esquecer. E se tu não te lembrares de mim tal como eu sou realmente, eu posso também não me lembrar durante muito tempo. E se eu me esquecer de Quem Sou, tu podes esquecer-te de Quem És, e ficaremos as duas perdidas. Então, vamos precisar que venha outra alma para nos lembrar às duas Quem Somos.



- Não vamos, não! - prometeu outra vez a Pequena Alma. - Eu vou lembrar-me de ti!



E vou agradecer-te por esta dádiva - a oportunidade que me dás de me experimentar



como Quem Eu Sou.        




E assim o acordo foi feito. E a Pequena Alma avançou para uma nova vida, entusiasmada por ser a Luz, que era muito especial, e entusiasmada por ser aquela parte especial a que se chama Perdão.



E a Pequena Alma esperou ansiosamente pela oportunidade de se experimentar como Perdão, e por agradecer a qualquer outra alma que o tornasse possível.



E, em todos os momentos dessa nova vida, sempre que uma nova alma aparecia em cena, quer essa nova alma trouxesse alegria ou tristeza - principalmente se trouxesse tristeza - a Pequena Alma pensava no que Deus lhe tinha dito.



Lembra-te sempre,- Deus aqui tinha sorrido - não te enviei senão anjos.

 
 
 
 
Texto: Neale Donald Walsch
Fonte:  http://flordeluali.blogspot.com/

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

NÃO COMEMORE O NATAL.

Peço que por uns segundos você esqueça o Shopping Iguatemi, o panetone (epa!), a árvore enfeitada, a mesa farta, o abraço protocolar dos parentes e me responda: o que se comemora mesmo no dia 25 de Dezembro?





Se não me engano é a data presumível do nascimento de uma criança paupérrima, cuja trajetória neste mundo pode ser resumida em uma frase que a tal criança, uma vez adulta, vivia repetindo: “ama o teu próximo como a ti mesmo”.

Se essa frase tivesse sido levada a sério, ao longo desses dois mil e nove anos poderíamos ter evitado um mar de sofrimento e clamor que marcou e tem marcado a presença humana no planeta: cruzadas assassinas, grandes guerras mundiais, escravidão de negros africanos, racismo de todas as formas, fome, miséria e aquecimento global.






Se a humanidade ocidental-cristã tivesse realmente aquela criança na conta de um deus, certamente que nem precisaria escrever leis absurdas, impor regras e limites de convivência, erguer “cercas embandeiradas que separam quintais” e outras complicações que estarrecem e empobrecem a vida.Bastaria ter o Sermão da Montanha como fonte de inspiração e orientador de condutas.

Mas a verdade é nunca demos a menor bola para o que o nosso aniversariante fez ou propôs.Montamos uma forma de viver, por essa banda do mundo, que corresponde exatamente ao contrário das suas melhores ideias.Construímos templos suntuosos para abrigar as correntes religiosas que fundamos e temos fundado, em nome de uma certa fé nesse homem que achamos ser Deus.Acontece que ele nunca pediu nada disso e até repudiava os que transformavam casas de oração em casas da moeda.





Inventamos e sustentamos milhares de padres e pastores que se arrogam professadores e exegetas da mensagem do “cara” e o fazem... da boca pra fora!

Por esses últimos dias, tivemos notícia de morte e desespero pelas chuvas de São Paulo, cenas explícitas de corrupção por bandidos de Brasília e do fracasso de Copenhague, cujos líderes, na sua maioria auto-intitulados “cristãos”, resolveram apressar, por simples egoísmo, a morte do planeta.





Por isso, se você se encaixa em alguma das categorias acima descritas, por favor, seja coerente e verdadeiro com você mesmo(a): no próximo dia 25, não comemore o natal.



Texto: Jorge Portugal
           Educador e poeta.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Há Metafísica Bastante em Não Pensar em Nada


                                  Há metafísica bastante em não pensar em nada.



O que penso eu do mundo?

Sei lá o que penso do mundo!

Se eu adoecesse pensaria nisso.



Que idéia tenho eu das cousas?                                         

Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?


                              Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma

                                                               E sobre a criação do Mundo?              



Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos

E não pensar. É correr as cortinas

Da minha janela (mas ela não tem cortinas).



O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!

O único mistério é haver quem pense no mistério.

Quem está ao sol e fecha os olhos,

Começa a não saber o que é o sol

E a pensar muitas cousas cheias de calor.

Mas abre os olhos e vê o sol,

                                                              


E já não pode pensar em nada,

Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos

De todos os filósofos e de todos os poetas.

A luz do sol não sabe o que faz

E por isso não erra e é comum e boa.



Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?

A de serem verdes e copadas e de terem ramos

E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar, 

           


A nós, que não sabemos dar por elas.

Mas que melhor metafísica que a delas,

Que é a de não saber para que vivem

Nem saber que o não sabem?



"Constituição íntima das cousas"...

"Sentido íntimo do Universo"...

Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.

É incrível que se possa pensar em cousas dessas.

É como pensar em razões e fins

Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores

Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.



Pensar no sentido íntimo das cousas

É acrescentado, como pensar na saúde

Ou levar um copo à água das fontes.



O único sentido íntimo das cousas

É elas não terem sentido íntimo nenhum.

Não acredito em Deus porque nunca o vi.

Se ele quisesse que eu acreditasse nele,   


                               


Sem dúvida que viria falar comigo

E entraria pela minha porta dentro

Dizendo-me, Aqui estou!



(Isto é talvez ridículo aos ouvidos

De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,

Não compreende quem fala delas

Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)



Mas se Deus é as flores e as árvores

E os montes e sol e o luar,

Então acredito nele,

Então acredito nele a toda a hora,

E a minha vida é toda uma oração e uma missa,

E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.



Mas se Deus é as árvores e as flores
  
E os montes e o luar e o sol,

Para que lhe chamo eu Deus?

Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;

Porque, se ele se fez, para eu o ver,

Sol e luar e flores e árvores e montes,

Se ele me aparece como sendo árvores e montes

E luar e sol e flores,                                                        


É que ele quer que eu o conheça

Como árvores e montes e flores e luar e sol.



E por isso eu obedeço-lhe,

(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).

Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,

Como quem abre os olhos e vê,

E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,

E amo-o sem pensar nele,

E penso-o vendo e ouvindo,

E ando com ele a toda a hora.




Fernando Pessoa

domingo, 6 de dezembro de 2009

Dorival Caymmi, O Pintor

"É doce morrer no mar,                    

Nas ondas verdes do mar..."

Prá mim, essa é uma das músicas mais bonitas da MPB. É pura simplicidade, é pura poesia, é a doçura personificada. Falar sobre esse cantor e compositor bahiano é muita pretensão, pois acredito que tudo já foi dito, ou melhor, não precisa mais palavras, pois elas são apenas o simbolismo escrito do fato, do homem, e só mesmo a experiência direta prá entender esse artista inigualável.








Entretanto o pintor Caymmi é quase que desconhecido, pelo menos prá mim e acredito, para  a maioria dos meus amigos. Não sei como, essa curiosidade martelou minha cachola e aí resolvi escrafunchar (como dizia minha saudosa mãe).




Como na música, suas pinturas são influenciadas  pelo azul do mar, pelo requebrado das baianas, pela jinga da capoeira e mais do que tudo, pela negritude da Bahia.






"O pintar lhe faz bem..." , como diria seu compadre e amigo de todas as horas, Jorge Amado, tranquilizando Stella, mulher de Caymmi, que ficou apreensiva com a extrema dedicação do seu marido à pintura, receando que ele abandonasse a música, ou a colocasse em segundo plano, e as dificuldades financeiras que poderiam advir dessa atitude.  




O amor pela pintura se tornou uma constante na vida de Caymmi - o convívio com artistas como Volpi, Rebolo, Pancetti e Graciano, no Clube dos Artistas e Amantes das Artes (conhecido como "Clubinho"), em São Paulo, estimulou ainda mais sua crescente atividade de pintor.




Seu estilo, nas próprias palavras do artista seria... "Eu acompanhei toda essa querela entre o Abstracionismo e o Figurativismo, mas não cheguei a uma posição definitiva. Sou um lírico em pintura. Gosto da harmonia das cores. Por outro lado, não posso me desprender da forma."









Além das paisagens, ele pintou vários retratos de amigos, familiares e autorretratos, principalmente nos idos de 40 e 50.










Esse artista, esse compositor, esse cantor, esse pintor, esse ser humano, esse Ser, ficou escrito, cantado e falado pelos quatro cantos do mundo, inclusive aqui no meu cantinho da prosopopéia e da verborréia -  parafraseando o grande Gil - mas sobretudo, guardadinho no meu coração até o dia que eu acordar desse sonho e dormir em outro.










É doce morrer...


Nas ondas verdes do mar meu bem

Ele se foi afogar

Fez sua cama de noivo

No colo de Iemanjá

É doce morrer...
 
 
 
 
 

 
 
 
 
Texto: Queila  
Fonte: Dorival Caymmi: o mar e o tempo por Stella Caymmi               
Fotos das pinturas:  http://www.jobim.org/

domingo, 29 de novembro de 2009

Sabedoria Zen

Uma xícara de Chá

Nan-In, um mestre japonês durante a era Meiji (1868-1912), recebeu um professor de universidade que veio lhe inquirir sobre Zen. Este iniciou um longo discurso intelectual sobre suas dúvidas.

Nan-In, enquanto isso, serviu o chá. Ele encheu completamente a xícara de seu visitante, e continuou a enchê-la, derramando chá pela borda. 


O professor, vendo o excesso se derramando, não pode mais se conter e disse:

"Está muito cheio. Não cabe mais chá!"

"Como esta xícara," Nan-in disse, "você está cheio de suas próprias opiniões e especulações. Como posso eu lhe demonstrar o Zen sem você primeiro esvaziar sua xícara?"



A Ordem Natural
Um homem muito rico pediu a um mestre zen um texto que o fizesse sempre lembrar o quanto era feliz com a sua família.

O mestre zen pegou um pergaminho e, com uma linda caligrafia, escreveu:

- O pai morre. O filho morre. O neto morre.

- Como? - disse, furioso, o homem rico. - Eu lhe pedi alguma coisa que me inspirasse, um ensinamento que fosse sempre contemplado com respeito pelas minhas próximas gerações, e o senhor me dá algo tão depressivo e deprimente como estas palavras?

- O senhor me pediu algo que sempre lhe fizesse lembrar a felicidade de viver junto à sua família. Se o seu filho morrer antes, todos serão devastados pela dor. Se o seu neto morrer, será uma experiência insuportável.                 


"Entretanto, se sua família for desaparecendo na ordem em que coloquei no papel, isso trata-se do curso natural da vida. Assim, embora todos passem por momentos de dor, as gerações continuarão, e seu legado demorará muito tempo."


Cada Um com seu Destino


Um samurai, conhecido por todos pela sua nobreza e honestidade, veio visitar um monge Zen em busca de conselhos. Entretanto, assim que entrou no templo onde o mestre rezava, sentiu-se inferior, e concluiu que, apesar de toda a sua vida lutando por justiça e paz, não tinha sequer chegado perto ao estado de graça do homem que tinha à sua frente.

- Por que estou me sentindo tão inferior? - perguntou, assim que o monge acabou de rezar. - Já enfrentei a morte muitas vezes, defendi os mais fracos, sei que não tenho nada do que me envergonhar. Entretanto, ao vê-lo meditando, senti que minha vida não tinha a menor importância.

- Espere. Assim que eu tiver atendido todos que me procurarem hoje, eu lhe darei a resposta.

Durante o dia inteiro o samurai ficou sentado no jardim do templo, olhando as pessoas entrarem e saírem em busca de conselhos. Viu como o monge atendia a todos com a mesma paciência e o mesmo sorriso luminoso em seu rosto. Mas o seu estado de ânimo ficava cada vez pior, pois tinha nascido para agir, não para esperar.

De noite, quando todos já haviam partido, ele insistiu:

- Agora o senhor pode me ensinar?

O mestre pediu que entrasse, e conduziu-o até o seu quarto. A lua cheia brilhava no céu, e todo o ambiente inspirava uma profunda tranqüilidade.




- Está vendo esta lua, como é linda? Ela vai cruzar todo o firmamento, e amanhã o sol tornará de novo a brilhar. Só que a luz do sol é muito mais forte, e consegue mostrar os detalhes da paisagem que temos à nossa frente: arvores, montanhas, nuvens. Tenho contemplado os dois durante anos, e nunca escutei a lua dizendo: por que não tenho o mesmo brilho do sol? Será que sou inferior a ele?

- Claro que não - respondeu o samurai. - Lua e sol são coisas diferentes, e cada um tem sua própria beleza. Não podemos comparar os dois.

- Então, você sabe a resposta. Somos duas pessoas diferentes, cada qual lutando à sua maneira por aquilo que acredita, e fazendo o possível para tornar este mundo melhor; o resto são apenas aparências.


Sem Trabalho, Sem Comida

HYAKUJO, o mestre Zen chinês, costumava trabalhar com seus discípulos mesmo na idade de 80 anos, aparando o jardim, limpando o chão, e podando as árvores. Os discípulos sentiram pena em ver o velho mestre trabalhando tão duramente, mas eles sabiam que ele não iria escutar seus apelos para que parasse. Então eles resolveram esconder suas ferramentas.           


 
Naquele dia o mestre não comeu. No dia seguinte também, e no outro.

"Ele deve estar irritado por termos escondido suas ferramentas," os discípulos acharam. "É melhor nós as colocarmos de volta no lugar."

No dia em que eles fizeram isso, o mestre trabalhou e comeu exatamente como antes. À noite ele os instruiu, simplesmente:

"Sem trabalho, sem comida."



Os Portais do Paraíso


Um orgulhoso guerreiro chamado Nobushige foi até Hakuin, e perguntou-lhe: "Se existe um paraíso e um inferno, onde estão?"



"Quem é você?" perguntou Hakuin.

"Eu sou um samurai!" o guerreiro exclamou.

"Você, um guerreiro!" riu-se Hakuin. "Que espécie de governante teria tal guarda? Sua aparência é a de um mendigo!".

Nobushige ficou tão raivoso que começou a desembainhar sua espada, mas Hakuin continuou:

"Então você tem uma espada! Sua arma provavelmente está tão cega que não cortará minha cabeça..."

O samurai retirou a espada num gesto rápido e avançou pronto para matar, gritando de ódio. Neste momento Hakuin gritou:

"Acabaram de se abrir os Portais do Inferno!"

Ao ouvir estas palavras, e percebendo a sabedoria do mestre, o samurai embainhou sua espada e fez-lhe uma profunda reverência.

"Acabaram de se abrir os Portais do Paraíso," disse suavemente Hakuin.


Certo e Errado

Quando Bankei realizava seus retiro semanais de meditação, discípulos de muitas partes do Japão vinham participar. Durante um destes Sesshins um discípulo foi pego roubando. O caso foi reportado a Bankei com a solicitação para que o culpado fosse expulso.

Bankei ignorou o caso.


Mais tarde o discípulo foi surpreendido na mesma falta, e novamente Bankei desdenhou o acontecimento. Isto aborreceu os outros pupilos, que enviaram uma petição pedindo a dispensa do ladrão, e declarando que se tal não fosse feito eles todos iriam deixar o retiro.

Quando Bankei leu a petição ele reuniu todos diante de si.

"Vocês são sábios," ele disse aos discípulos. "Vocês sabem o que é certo e o que é errado. Vocês podem ir para qualquer outro lugar para estudar e praticar, mas este pobre irmão não percebe nem mesmo o que significa o certo e o errado. Quem irá ensiná-lo se eu não o fizer? Eu vou mantê-lo aqui mesmo se o resto de vocês partirem."


Uma torrente de lágrimas foram derramadas pelo monge que roubara. Todo seu desejo de roubar tinha se esvaecido.



Fonte: http://www.oraculoching.com/pt/ching.html

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Gilberto Gil, Uma Entrevista

Enfim... Dessa vez, Gilberto Gil não falou sobre “o prisma transitório da protomatéria nasciva”. Nem sobre a “prosódia popular do cancioneiro”. Certamente, aproximou-o da objetividade a passagem pelo Ministério da Cultura. Ele foi titular da pasta durante seis anos, no governo Lula, mas jura não sentir saudade da experiência. Foi, assegura, “de bom tamanho”.



Aproveitando a deixa do dia da Consciência Negra, comemorado na última sexta-feira, Gil fala (objetivamente!) sobre as questões raciais no Brasil. Caminhando nos rumos da onda verde, declara aberto apoio a Marina Silva, explica as tão controvertidas palavras do amigo Caetano Veloso sobre o presidente, e faz suas algumas palavras dele: "Já estou na campanha dela. Não preciso nem explicar o que ela significa. É como Caetano disse: política e socialmente, Marina é um Lula, é um Obama".



Nesta excelente entrevista, concedida por Gilberto Gil ao jornalista Ivan Marsiglia, do Estadão, o compositor, que está em turnê na Europa, ainda diz que o Brasil é hoje um país menos preconceituoso e elogia FHC e Lula. Conversa também sobre direitos autorais, o enfrentamento entre as novas religiões protestantes e o candomblé e o pouco caso do governo para com a Cultura e o Meio Ambiente. Imperdivelmente objetiva!




Sexta-feira foi o Dia Nacional da Consciência Negra. Celebrar esse tipo de data faz diferença?

Há uma percepção na humanidade inteira de que essas coisas, de modo geral, adiantam. Na década de 80, fui fazer um show em Washington e me telefonaram dizendo que Stevie Wonder queria me ver. Saímos para jantar juntos e perguntei o que ele tinha ido fazer na capital americana. "Estou batalhando pelo Martin Luther King Day", ele respondeu, referindo-se à implantação de um feriado devotado à causa negra. O dia de homenagem a Martin Luther foi de fato oficializado (em 1986). E, anos depois, temos a eleição do primeiro presidente negro americano. Você pode me dizer que não teve nada a ver, mas no final das contas é tijolo sobre tijolo, pedra sobre pedra, que essas coisas vão sendo construídas.



Muito de sua obra musical vem da mistura de costumes, ritmos ou signos de que o Brasil é feito. Compartimentalizar o debate político entre "brancos" e "negros" pode vir a restringir as trocas culturais?

Essa não é a única compartimentalização que se nota dentro das totalidades. Compartimentalizações existem porque existem desigualdades, que precisam ser atacadas. E diferenças, que precisam ser respeitadas. Unidade não é uma abstração, é feita de partes que têm vida própria. Elas devem respeitar o sentido das totalidades, dos interesses comuns, então a política é feita disso. Se não existissem interesses particulares, não existiria política.



Como o senhor se posiciona a respeito da política de cotas para negros nas universidades?

Eis uma questão política, o ideal contemporâneo de fazer reparações, de refazer o equilíbrio que foi rompido em momentos específicos da história - como a escravidão. São técnicas de reparação. Sou a favor e tenho reiterado isso. Cotas já foram experimentadas em outros países, com êxitos e fracassos, e podem ser aplicadas no Brasil, parcialmente, periodicamente, até o momento em que funcionem ou deixem de funcionar. Experimenta, não custa nada.







Mas críticos dizem que essas ações podem reforçar a velha ideia de que a humanidade se divide em raças.

A questão não é racial, é social. São grupos humanos historicamente discriminados por alguma razão. No caso é "raça", mas há tantas outras! As políticas compensatórias da pobreza, tipo Bolsa-Família, existem por isso, por causa de desigualdades e diferenças que precisam ser atacadas por uma visão mais aprofundada de humanismo, de republicanismo, de compromisso com a democracia, com a ideia do oferecimento de oportunidades mais ou menos iguais para todos. O argumento de que essas políticas podem intensificar processos racialistas... Sim, mas aí cabe a vigilância, cuidar para que o efeito colateral do remédio não seja mais forte do que seu efeito curativo.



Em entrevista de 2005, o senhor falou de sua passagem pela Gessy Lever, na década de 60, aos 23 anos. Disse que era uma espécie de "experimento racial" da empresa. De lá para cá, a inserção do negro na sociedade brasileira mudou?

Era um experimento que tinha esses componentes sociais e raciais. Eles queriam dar chance a setores das classes médias brasileiras que emergiam, para que viessem a ocupar postos de destaque, de comando, na empresa. A inserção do negro é um processo um tanto ambíguo, mas a situação tem melhorado, no estilo dois passos para frente, um para trás: se você somar, há um avanço, um deslocamento mínimo positivo. Você vê que a presença do preconceito, que era uma coisa muito forte e determinante das relações sociais no Brasil, tem se atenuado, diminuído. Estava lendo ontem mesmo sobre o ministro Joaquim Barbosa. Ele é um exemplo, é o negro que chegou ao Supremo pela primeira vez.



O Brasil é um país preconceituoso?

Não creio que seja mais do que o conjunto da sociedade humana. Está na média. De certa forma há até mais cordialidade, compreensão, interracialidade e intersociabilidade na sociedade brasileira do que em outras.





Mas a cultura afro-brasileira é reconhecida como deveria no País? Grupos evangélicos de Salvador, por exemplo, estão tentando substituir o termo "acarajé" por "bolinho de Cristo" ou "acarajé de Jesus"...

Isso é, de novo, questão política. Quarenta anos atrás era a Igreja católica que, de certa forma, tentava se opor à proliferação e disseminação dos cultos de origem africana. E se associava ao Estado nessa tentativa de interdição do candomblé e da umbanda. Depois, a igreja cedeu espaço, assim como o Estado: em 1972, na Bahia, caiu a lei que interditava os candomblés e os obrigava a tirar licença municipal para funcionar. E passaram, como qualquer outra religião, a ter garantido o seu direito de liberdade de culto. Agora os evangélicos, na sua emergência e luta por espaço político, se opõem aos católicos, aos cultos afro-brasileiros, etc. São grupos com novos apetites políticos.



Apetites que representam alguma ameaça?

Ameaças há. No candomblé da minha mulher em Salvador houve um dia em que ela teve que confrontar um grupo de evangélicos que foi lá para a porta do terreiro e se pôs a gritar. Coisas assim acontecem. Agora, na perspectiva do deslocamento histórico, o candomblé já foi absorvido pela sociedade brasileira. E mais: está além-fronteiras, com presença forte no Uruguai, na Argentina, no Paraguai e outros países da América do Sul, tem milhões de adeptos, é respeitado. Fica restrito ao frisson político, à luta encetada por esses segmentos religiosos emergentes.







A umbanda e o candomblé perderam terreno nas favelas, onde proliferam igrejas evangélicas...

É que o garimpo dos evangélicos se faz nas classes populares, onde há uma forte presença do negro e das religiões afro-brasileiras. É por isso que atacam especificamente esses setores e recrutam contingentes para as suas igrejas.



Nos cinco anos e meio em que o senhor esteve no Ministério da Cultura, não foram poucos os que lhe perguntaram se sentia saudade da música. Tem saudade da política?

Saudade, propriamente, não. Tenho lembranças boas e um sentimento de que foi um serviço prestado com muita dedicação e alguma relevância do ponto de vista da percepção da sociedade. Foi interessante servir a um presidente que marca um momento histórico da vida republicana brasileira, que é Lula. Foi um período da minha vida pensado para ser curto e que durou quase seis anos. Está de bom tamanho (risos).







Na época, o senhor declarou que sua frustração foi não ter conseguido elevar a fatia do orçamento federal para o MinC de 0,5% para 1%. Com toda essa pujança da economia brasileira hoje, o País não aprendeu a valorizar sua cultura?

Ainda não. No sentido de alçá-la a um patamar de instituição estratégica, prioritária, com quadros, com orçamento e atenção governamental, ainda não. É preciso ir além: pensar a cultura como elemento fundamental para o desenvolvimento, para a economia e para a cidadania. Cultura já é hoje um setor importante nos PIBs de vários países. No caso do próprio Brasil, entre 5% e 7% vêm do setor. E isso vai crescer com a migração da economia do hardware para o software, dos setores pesados para os setores leves. É preciso, portanto, prestar atenção nessa tendência. Nos EUA, a maior exportação já não é de armamento, mas de produtos culturais: filmes, jogos eletrônicos, música. O Brasil se ressente de não ter uma língua de ponta para lastrear suas investidas internacionais. Mas vai melhorando diante do enfraquecimento da hegemonia dos produtos culturais de língua inglesa no mundo. Estou vendo aqui na capa da The Economist, o Cristo decolando. E também no filme 2012, sobre o fim do mundo, o Cristo surge como ícone de civilização, tanto para o bem quanto para o mal. O Brasil está chamando a atenção do mundo.



Falando em cinema, o filme "Lula, o Filho do Brasil" será lançado com ingressos populares e todo um esquema de divulgação em massa, mas críticos têm apontado sua vocação como peça promocional...

Mas é promocional de quem? O filme foi feito por quem? Algum partido político ou algum ministério? É um filme que resolveram fazer sobre Lula. É a cultura que está pegando o bonde da popularidade dele, não o contrário. Oxente, estão fazendo um blockbuster com um tema popular! Agora mesmo foi lançado um filme chamado Besouro, também desenhado para ser um estouro do de bilheteria, com boa realização técnica. Ainda não o vi, mas até canto uma canção nele. Besouro é outro exemplo disso, um ídolo popular, negro, mitológico capoeirista que existiu na Bahia e é transformado em super-herói. Essa é uma tendência e o Brasil terá interesse de ocupar os espaços do grande cinema popular de massas, na linha de Os Dois Filhos de Francisco. Também no cenário musical não é mais a classe média que domina a produção. São as favelas de São Paulo e do Rio, as periferias de Salvador e Recife, que estão criando novos gêneros, ditando novas modas.


No dia de seu desligamento do ministério, o senhor disse que cederia a canção "Refazenda" para divulgar "o avanço da agricultura familiar com os biocombustíveis". Com a euforia do pré-sal, pouco se fala do assunto. Isso o preocupa?

Me preocupa sim. É aquela mania: acharam uma pepita de ouro, então não precisa mais trabalhar, plantar algodão, cebola. Vai viver da pepita de ouro. Não é assim. Nós estamos com a Convenção do Clima de Copenhague, que vai tratar do aquecimento global, batendo à porta. O petróleo, os combustíveis fósseis, são datados na história, ou seja, não são inesgotáveis. Está lá a luta de Obama, dos setores avançados do empresariado americano e da academia, em prol da prevalência das fontes alternativas. Não podemos nos descuidar disso. A instituição do meio ambiente no Brasil precisa ser fortalecida. É a mesma questão da cultura: o ministério do Meio Ambiente ainda não está à altura, não tem orçamento, quadros, prestígio ou espaço no gabinete da Presidência, do jeito que deveria ter. Lula não dá a importância que deveria dar ao Ministério do Meio Ambiente.







O senhor diria que o pré-sal é uma bênção ou uma maldição?

Nem bênção nem maldição. É um recurso adicional num setor que ainda significa riqueza. Mas é só isso. O Brasil vai ter uma folga em combustível fóssil - e isso ajuda o País a pesquisar novas alternativas energéticas. Vai inclusive poder investir mais em pesquisa.

A senadora Marina Silva deixou o PT para ingressar em seu partido, o PV, e lançar-se candidata à Presidência da República. O senhor vai mesmo apoiá-la?

Já estou na campanha dela. Não preciso nem explicar o que ela significa. É como Caetano disse: politicamente e socialmente, Marina é um Lula, é um Obama. É uma mestiça brasileira que emerge, é mulher também, preparada, sensível, culta no sentido da vida e das coisas que circulam na periferia da política, é imersa nisso tudo desde a adolescência. Gosto muito dela. Nós trabalhávamos no mesmo prédio em Brasília, convivemos muito, temos afinidades. Confio nela.



Politicamente, ela significa o novo?

Sem dúvida. É um deslocamento no sentido do avanço. Assim como Fernando Henrique foi um belo presidente para o País e deixou espaço para que Lula o sucedesse de forma ainda mais interessante, uma presidência com Marina Silva seria um avanço ainda maior para o País. Do ponto de vista simbólico e, estou seguro, também do ponto político e pragmático. Pois ela seria hábil o suficiente para se cercar do que pode haver de melhor hoje no País, estabelecer diálogos com áreas importantes do pensamento brasileiro e do empreendedorismo.


E o que o senhor achou do complemento da frase de Caetano: "Marina não é analfabeta como o Lula, que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro"?

Caetano disse claramente nas explicações que deu depois da entrevista, que foi apenas descritivo. Quis dizer uma coisa que é pública no Brasil: os linguistas aplaudem e o próprio Lula gosta do fato de ser visto como uma pessoa iletrada que chegou lá. Só que Caetano usou os termos mais chulos (risos) para se referir a uma coisa que todo o mundo admite, e da qual todos nos orgulhamos, o fato de um homem não letrado ter chegado à Presidência com tanto êxito.



Os discursos que fez e as conversas que teve em Brasília danificaram a sua voz. Como ela está?

Está indo bem. Voltei a cantar mais do que falar e tenho mantido cuidados fonoterápicos permanentes. Faço exercícios de voz diários para fortalecimento do aparelho vocal. Então minha voz tem estado bem melhor do que à época em que estava no ministério.


E que tal está o novo CD e DVD, o acústico "Bandadois"?

Havia uma demanda por parte de muita gente, fãs e amigos, para que eu me dedicasse a esse modelo simples, suave, do projeto acústico. Desde o disco Gil Luminoso (1999), que foi um projeto de voz e violão, tenho me dedicado a incursões por esse formato. Juntei-me a meu filho Bem, no Bandadois, e agora veio o Jaques Morelenbaum. Então, é um "bandatrês". Um modelo que me dá tranquilidade, é mais manso, o uso da voz é mais moderado e não tenho que brigar com a intensidade timbrística das percussões ou instrumentos elétricos. Propicia uma expressividade mais sob meu próprio domínio e batuta. Mas também gosto das performances "stoneanas", tão típicas de Londres (risos).



Hoje o senhor revê Londres com alegria ou melancolia?

A lembrança daqui é boa. Ainda hoje saí à rua com a Gilda (Mattoso, assessora do cantor), vendo as pessoas, os prédios, as ruas, a arquitetura, ônibus específicos... Londres é um lugar diferente, tem sua marca própria. Dizem que a Inglaterra é a China do Ocidente.


Na entrevista que deu ao "Aliás" quatro anos atrás, o senhor disse que seus filhos não iriam viver dos seus direitos autorais. Vimos, de fato, a autoria ser colocada em questão no mundo da internet. Qual é sua visão hoje?

De fato, há um desmantelamento, uma desconstrução do modelo clássico de autoria, que estava em vigência até agora. E muita coisa vira escombros, ruína, com prejuízos a grupos de interessados e titulares de direitos que viviam disso. Mas há um segundo aspecto importante no princípio do direito autoral, que é o acesso à obra, e que vem emergindo. Uma extensão imensa da acessibilidade e da própria autoralidade: falo das novas mini e microautoralidades que são proporcionadas pelo mundo digital. Todas as formas artísticas vão passar a ter uma dimensão mais pública mesmo. E para o atendimento dessa dimensão será preciso redesenhar todo um sistema legal e de direitos.






O que a sua parabólica anda captando em termos de cenário político para o Brasil?

Os fatos e os gestos internos, do próprio Brasil e do mundo, falam de forma mais eloquente do que eu poderia falar. Hoje o País é reconhecido e Lula é uma liderança mundial. Viajo pelo mundo todo e fico vendo: os repórteres só me perguntam disso, o Brasil, o Brasil. Eu fico pensando: "O que vou dizer a eles?" Não tenho nada a dizer. Eu sou o Brasil (risos).



Fonte: http://www.nublog.com.br/index.php

sábado, 21 de novembro de 2009

Eu Sou Tu , Rumi

Rumi Oh Rumi
Tu és tão Belo
Tu és tão puro
É o sol da poesia no céu do meu Ser
É luz..
Verdade...
Infinito...
Deus..
Eu sou Tu
Tu...Eu...Um.

(Queila)




Eu Sou Tu


Eu sou as partículas de poeira na luz do Sol
Eu sou o sol redondo
Para as partículas de poeira
Eu digo "fica"
Para o sol
"Segue tua marcha"
Eu sou a neblina da manhã
E a respiração da noite
Eu sou o vento na copa das árvores
E as ondas nos rochedos
Mastro...Timão
Timoneiro e quilha
Eu sou a fundação dos recifes de corais
Eu sou uma árvore
Com um papagaio pousado no seu ramo
Silêncio
Pensamento
E voz
O som musical
Vindo de uma flauta
Uma lasca de pedra
Um tilintar no metal
Ambas as velas
E a mariposa louca em torno delas
Rosa
e o passarinho
Perdidos na fragância
Eu sou todos os Seres
A galáxia girante
A inteligência evolucionária
A ascenção
e a queda
O que é
e o que não é
Tu que conheces Jalalludin
Tu que és um em todos
Digas quem sou eu
Diga Eu sou Tu

(Jalalludin Rumi)
(Tradução: Queila )


Mundos Infinitos
(Rumi)


Consciência Negra

Zumbi
Pelo ventre negro de Palmares
Respirou o seu primeiro ar,
Livre e leve em guerras.
Caminhou o seu primeiro passo,
Solto e tranquilo em batalhas.
Falou a sua primeira palavra
E navegou sobre ela
Até a hora da sua morte:
Liberdade


Jean Claudio



sábado, 14 de novembro de 2009

O Paraíso Perdido e depois Achado




Sempre que nos referimos a jardim nossa tradição ocidental judaico-cristã nos remete, inconscientemente ,à idéia de paraíso. Não diz a Bíblia que Adão e Eva viviam no paraíso, num jardim florido e magnífico?

A palavra jardim é de origem hebraica (Gan eden) unindo 'gan' que significa proteger defender à palavra 'éden' cuja significação é deleite, encantamento, satisfação.









Quando imaginamos um jardim pessoal, vamos criar uma paisagem idealizada que nos comova e atinja todos os nossos sentidos.
Segundo Burle Marx ”Jardim é sinônimo de adequação ao meio ecológico para atender às exigências naturais das civilizações”.


Assim como em todas as manifestações artísticas existe uma influência da cultura de seu tempo, o estilo do jardim também recebe essa influência ao longo dos séculos. Cada época, cada cultura, cada povo tem o jardim que os representa.
Os jardins mais antigos de que se tem notícia foram os egípcios – há cerca de 4000 anos.
Eram influenciados pela crença deste povo em astrologia, ocupavam grandes espaços às margens do rio Nilo e tinham traçados geométricos. As plantas usadas eram, em sua maioria, úteis e frutíferas. Algumas tinham um significado simbólico, como o lótus e o papiro.








Os jardins egípcios influenciaram os gregos que, no entanto, não usavam formas geométricas devido à topografia da região.






Entre as Sete maravilhas do Mundo Antigo estão os jardins suspensos da Babilônia.

Palmeiras e roseiras eram cultivadas sobre o teto das casas, em terraços que possuíam vários patamares e um belo sistema de irrigação. A vegetação passa a ser útil pelo valor ornamental, sofrendo influência da civilização persa.





Os romanos também se esmeraram em seus jardins e usavam mosaicos, fontes e estátuas.







Com o advento da Idade Média o jardim passou a ser confinado nos mosteiros e castelos. Cultivava-se hortaliças, plantas medicinais, frutíferas e flores de corte para uso nos altares.







Constrastando com a sobriedade e linhas retas do jardim europeu da Idade Média, a China e o Japão criaram um estilo peculiar, recriando a natureza pura, usando plantas, areia, água, pedras para imitá-la. É um estilo de fundo espiritual, convite à meditação e à transcendência.



Com o fim da Idade Média surge o Renascimento , trazendo novas formas para todas as manifestações artísticas. O jardim também sofre essa influência: torna-se suntuoso, com plantas esculpidas em forma de esculturas. Ele vai assumir características próprias em cada país europeu da época.





Sucedendo ao estilo renascentista, o mundo recebe o Romantismo. ele traz para o jardim a busca pela reprodução da natureza: árvores, riachos, rochedos, ruínas, tudo de forma a reproduzir o ambiente natural.






Hoje, o jardim incorpora os estilos do passado com duas tendências que se opõem: a forma geométrica e o naturalismo.







Qualquer que seja o estilo escolhido, o importante é que seu jardim seja seu ”paraíso”. O lugar que represente para você um presente para os sentidos.

Meu paraíso...




Texto: Regina Motta
http://www.paisagismodigital.com.br/







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