terça-feira, 31 de março de 2009

O Cérebro

Como é limitado o cérebro, por mais cultivado ou requintado que seja! Nada dissipa a sua mediocridade. Ainda que vá a lua, explore o universo ou as profundezas da terra, projete e monte o mais complexo maquinismo, inclusive computadores capazes de inventar novos computadores, e mesmo que ele venha a causar a sua própria destruição e ressurreição, nada disso o livrará da mediocridade.




O cérebro só é capaz de funcionar no tempo e no espaço, toda filosofia é limitada por seu próprio condicionamento e as teorias e especulações são urdidas por sua astúcia. É inútil qualquer tentativa de fuga de si mesmo.


Seus deuses e redentores, seus mestres e líderes têm a medida de sua própria mediocridade. Em seu esforço para
superar a estupidez, a eficácia é determinada pelo grau de sua astúcia. Ora buscando, ora pressionando, o cérebro vive na sombra de seu próprio sofrimento, incapaz de transceder a sua futilidade.
A incessante atividade do cérebro, na busca de suas projeções, é inação. As reformas postas em práticas estão sempre precisando de novas reformas. Acorrentado ao círculo vicioso da ação e inação, o pensamento é o desdobramento de seus sonhos.

Ativo ou inerte, nobre ou ignóbil, é infinita a sua superficialidade. Incapaz de escapar de si mesmo, vive na sordidez de sua virtude e moralidade. Só lhe resta permanecer completamente imóvel, o que não deve ser confundido com inércia e indolência. Esta imobilidade é a única maneira de se preservar a sensibilidade do cérebro.


Na renuncia de si mesmo e na rejeição de suas atividades, cessam as suas habituais e defensivas reações, bem como o vício de julgar, condenar ou justificar. E é nessa renúncia que a mediocridade desaparece e cessa o movimento do vir-a-ser, do desejo do preenchimento.


Revela-se, então, o que é: trata-se de um instrumento
mecânico, inventivo, calculista, funcional, cuja perfeição é assombrosa. Como toda máquina, o cérebro é passível de desgaste e morte.
Torna-se medíocre ao tentar penetrar no insondável mistério do desconhecido, do imensurável. O conhecido é o seu elemento, e lhe é vedado atuar no incognoscível.



Suas criações pertencem ao campo do conhecido, mas nem a palavra nem as imagens podem captar o mistério da criação.
Jamais conhecerá ele esta beleza, pois a imensidão do indescritível somente aflora na completa imobilidade do cérebro.
Texto: Jiddu Krishnamurti
Pinturas: Picasso, Frida, Tarsila e Queila




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